Rota do tabaco, 2016
Na obra de Dalton Paula, objetos são destituídos de suas funções originais para se tornarem suporte da pintura. Primeiro as enciclopédias, antigas detentoras de um conhecimento universalista, tiveram suas capas sobrepostas por representações de sujeitos e saberes comumente omitidos em seu conteúdo, como negros e indígenas. Agora esse procedimento se repete sobre um conjunto de alguidares, pratos cerâmicos que recebem a comida e também as oferendas em rituais de religiões afro-brasileiras. Com a pintura em seu interior, esses objetos confrontam os discursos hegemônicos da arte e da política, buscam novos personagens e reencenam passagens de nossa história. Piracanjuba, em Goiás, Cachoeira, no Recôncavo Baiano, e Havana, em Cuba, são cidades produtoras de tabaco. Essa atividade econômica remonta ao passado colonial e à migração de africanos escravizados nas Américas. Paula viajou aos três pontos dessa Rota do tabaco (2016) para pesquisar como essa herança se apresenta hoje. Encontrou desde a precariedade dos meios de trabalho nas fábricas de cigarrilhas até o uso dos charutos como ícone da revolução comunista. No vasto imaginário retratado, o fumo é um contexto omitido que revela o contraste entre corpos negros e roupas brancas, entre a invisibilidade da cultura afro-brasileira e os legados de cura – medicinal e espiritual – extraídos do tabaco.