Gravação a partir das pesquisas que compuseram a obra de Jorge Menna Barreto. Aborda questões como restaurações variadas, PANC´s, interação das plantas e a mulher em trabalho de campo.
A: Como o nome do restaurante é Restauro, está priorizando um alimento que também tenha um papel de regeneração do estômago.
B: É, e restaurar não é só essa coisa de restauração ambiental, mas também, tem muito de restauração do próprio ser humano. Você vê assim que a autoestima, isso resgata a autoestima das pessoas, da família, de agricultores...
A: É, com certeza! Até da saúde também, não é?!
B: E uma coisa que eles estão começando a trabalhar, é uma coisa assim… eles estão resgatando essa coisa de trabalhar com espécies nativas. Eu não sei se os chefes de cozinha têm esse conhecimento, acho que é importante saberem... O SAF é assim: lógico, tem uma abóbora orgânica, a mandioca, o milho… só que de repente de usar uma coisa assim: uma fruta que dá, como a uvaia, uma fruta da Mata Atlântica que quase ninguém conhece, entendeu? E que é super saborosa, é uma das minhas prediletas...
A: Ah! Quero provar, eu não conheço.
B: Me chama. Eu tenho umas coisas assim, dá para resgatar essas coisas nativas...
A: Nossa. Isso é super importante.
B: Que está vinculada ao SAF, todos os projetos têm que ter espécies exóticas e nativas da Mata Atlântica. E também tem uma coisa super legal: você já ouviu falar das Pancs?
A: Sim, sim...
B: Que são as Plantas Não Convencionais, então, já existem umas pessoas que estão começando, mesmo dentro do SAF, a trabalhar as nativas, que acabam sendo um pouco Pancs, porque elas não são convencionais e comercialmente conhecidas.
A: É escultórico, é desenho, é cor, é, sei lá, tem uma coisa, a magia, que tem aquela... [som de dedos estalando]
D: E o que trabalha a intuição, a intuição que é muito e, até a gente estava lembrando disso, porque ontem eu estava aqui em cima de um material de divulgação do nosso trabalho de Educação Ambiental e, em 2012, a gente criou aqui e teve que bolar na hora, e saiu assim: “Arte na Terra”. É que, na verdade, para gente era isso. Quer dizer, tem gente que acha “Ah! É arte né...”, aí fica muito pautado assim nas artes, que existem, “Ah! Então vamos fazer teatro lá...”. É, mas, na verdade, o Arte na Terra para gente é agrofloresta. Que é fazer a arte na terra. Porque é meio que fazer ali e dentro dessa intuição de toda a sensibilidade, é artesanal.
E: E a gente está fazendo uma pesquisa de faculdade, para manejar a área de uma certa forma para ver a quantidade de matéria orgânica, cobertura de canteiro e tal. Cada canteiro é coberto de um jeito, de um formato, na mata aqui.
F: Eu faço mestrado na agroecossistemas, em Florianópolis.
A: Ah! Você é de Floripa?
F: Eu sou agrônoma e aí me interessei pela agrofloresta (AF). Aí eu vim. Queria fazer uma pesquisa com as AFs... e eu já tinha uma linha com meu ex-orientador, de testar consórcios. Mas, era mais para testar misturas de árvores. Mas aconteceram alguns imprevistos e eu acabei tendo oportunidade de vir fazer o trabalho aqui. Então a proposta foi de testar os consócios de hortaliças. Mas, para analisar como as plantas interagem de acordo com algumas características delas, como a botânica, a altura de planta, a arquitetura dela, o tipo de nutriente que ela explora no solo. Na verdade, o que eu senti foi uma dificuldade de aceitar uma mulher fazendo pesquisa de campo. Ele queria me colocar logo dentro do laboratório de jaleco, ou então que eu fizesse banco de dados. Ficasse trabalhando digitando, ou trabalho de escritório ou de laboratório [risada]. Ele incentivava mais os rapazes nos trabalhos de campo, e olha que esse professor é jovem.
A: Uma coisa que a gente ficou pensando muito desde ontem é essa noção de escala mesmo.[barulho de serra elétrica]. A gente saiu ali de uma coisa que está cultivando brotinho mínimo. Assim, em termo de escala, é a potência de um pensamento que é revolucionário. Mas, daí quando tu vê, o mundo como tá… É um choque assim... ontem a gente até parou para captar a paisagem sonora em uma plantação de cana e a gente não viu um inseto, um pássaro, nada.
G: Como alguém consegue sobreviver naquilo [risada]?
A: E um silêncio assim, que parecia do fim do mundo. Nossa, acabou, não é?
[som de pássaros]
G: Eu confesso que eu imaginava que seria bem silenciosa, mas, foi mais do que imaginava.
A: Exatamente! Marcelo, eu tinha a imagem, sabia, mas não sabia que seria um silêncio tão... tão pesado. Uma coisa como “urrrrr” [onomatopeia com a boca], parece que suga.
G: Olha isso! Gente, estou chocado.
A: Putz! Eu entraria para gente tentar. Acho que isso deveria entrar no projeto, esse contraste...
G: Uhum...
A: Como oposto.
G: Sim, do que a gente quer...
A: É o que vai, é o que vai mostrando, que também tem.
G: Mas é uma dificuldade. A gente conseguir transportar essa realidade do silêncio. A: Mas eu acho que é um áudio conceitual, porque, vai ficar uma que está rodando. Parece que está justamente essa ausência. Tu entende? Só é reconhecível enquanto título. Se tu disser assim: “Fazenda de cana em São Pedro”. E daí não tem nada no som.
G: Tem um som, não é?
A: Tem o que a gente gravou... que é o nada.
Autoria / Authorship:
Jorge Menna Barreto, Marcelo Wasem
Decupagem, criação e edição / Decoupage, creating and editing:
Izabel Süssekind, Marcelo Wasem, Mariana Brum, Nathan Braga, Thatiana Montenegro, Vitor Rocha, Yago Toscano
* Os áudios do Campo Sonoro foram transcritos e/ou editados visando uma leitura mais acessível / All Soundfield's audios were transcribed and/or edited aiming to produce accessible contents